O Lado B do Postal

As férias são dos poucos momentos da vida em que não temos de nos amargurar no domingo à noite quando pensamos na segunda de manhã. Enquanto duram, e sabemos que duram pouco, todos os dias são dias Santos. Mais ou menos. Não é raro que as águas calmas tragam o entulho à superfície. As expetativas libertadoras começam com manhãs azuis e um calor desejado. As mágoas e cansaços chegam ao estaleiro. Sente-se o cheiro da bonança. O luxo do tempo, a volúpia do lençol que nos abraça com um carinho desmedido, o subsídio de férias a verter do bolso, o calção caqui, a tatuagem que finalmente vê a luz do dia, os corpos lustrosos, as malas tão cheias quanto as expetativas, a bandeira içada e a corneta da largada.

O cenário está montado. Tudo impecável, exceto que na partida das férias regressa a vida suspensa do casal e família. Aquilo que começa bem pode muito bem, estatisticamente comprovado, acabar mal. Uma coisa é ver, uma outra é estar. Eu via a minha mulher, agora estou com a minha mulher. Eu via os meus filhos, agora aturo os meus filhos e toda a vizinhança que se acerca por estas alturas de pausa, incluindo os filhos dos outros. As férias são uma peneira fina. O ócio cobra um preço elevado a um mar de incautos encurralados numa ilha. Ninguém reclama mas muitos anseiam pelo regresso à "vida normal". Já está bem, obrigado. Para o ano há mais.

Fotografia: Mjustino