Fotografia: Mjustino

Matéria Carnal

A Maria e o Manuel são primos afastados. Casaram porque não havia mais com quem casar. E assim assumiram o vestido e o fato coçado do casamento dos pais. Tudo ali é raro, salvo o desespero e o tempo. Para viver naquele deserto de flores é preciso aprender a pulso que a ausência tem os seus méritos. Esta ideia aplica-se ao amor carnal: não é costume assistir-se a rixas nem a crimes passionais, não porque sejam abençoados por uma candura sentimental. Não há matéria humana. E de tão poucos que são e do tanto que se necessitam não se criou esse costume. Mas já se deu um ciúme que levou um marido aturdido a matar a sua mulher. Por vezes acontece: uma traição ou uma resposta torta recebem em troca uma paulada ou um tiro seco. Mas a população é quase toda ela inocente. As outras desgraças chegam de tempos a tempos sobre a forma de seca e escassez de jorna. A tortura de lavrar neste inferno é paga com migalhas, expondo a miséria e o conformismo. Alguns destes não aguentam e comem veneno ou atam o laço. Deixam de sentir a esperança que o dia seguinte ou o próximo venha desfazer o peso incomensurável do moribundo; perdem o fio da salvação. Apaga-se a luz, ficam presos às lágrimas que escorrem sem resposta. A solidão é uma cobra vadia. O fim é a menor das dores.